Opnião
Novembro Azul e o preconceito silencioso

“A verdade é que o cuidado com a saúde não é uma questão de gênero, mas de responsabilidade com a própria vida e com aqueles que nos amam”
Novembro chegou, e com ele, o manto do Novembro Azul, o mês dedicado à conscientização e prevenção do câncer de próstata – o segundo tipo de câncer mais comum entre os homens brasileiros. Em Valinhos, o poder público, por meio da Secretaria de Saúde, e a sociedade civil, com a notável atuação do Grupo Rosa e Amor, uniram forças em uma campanha ampla e essencial, cujo lema ressoa com urgência: “Diagnóstico Precoce Salva Vidas”.
As ações em nossa cidade – que incluem rodas de conversa, atendimentos especializados em UBSs, e a ampliação do acolhimento pelo Grupo Rosa e Amor para o público masculino – demonstram um esforço louvável para desmistificar e facilitar o acesso à informação e aos exames. Contudo, por mais completa que seja a estrutura de prevenção, ela esbarra em um obstáculo mais antigo e teimoso que a própria doença: o preconceito masculino em cuidar de si.
O câncer de próstata, quando detectado em fase inicial, tem chances de cura que beiram os 90%. Esta estatística, por si só, deveria ser suficiente para motivar qualquer homem a encarar a prevenção anual, que inclui a dosagem do PSA (Antígeno Prostático Específico) no sangue e, crucialmente, o exame de toque retal. No entanto, é precisamente esse último exame que se torna o calcanhar de Aquiles da saúde masculina.
O medo, a vergonha ou, em última análise, o machismo arraigado, levam muitos homens a adiar a consulta com o urologista, a negligenciar sintomas como dificuldade para urinar ou jato fraco, e a se apoiar em mitos perigosos. É a perpetuação daquela figura masculina “indestrutível” que ignora a dor e desdenha do cuidado preventivo, associando-o, de forma ridícula, a uma suposta fragilidade ou perda de virilidade.
O urologista Sérgio Augusto Skrobot, em artigo recente, reforçou a importância da dupla PSA e toque, classificando como MITO a ideia de que um exame substitui o outro. Ele sublinhou que, juntos, são capazes de detectar precocemente até 90% dos casos. O preconceito contra o exame de toque, portanto, não é apenas um tabu; é, literalmente, um risco de morte. A procrastinação não transforma um tumor em doença benigna; transforma-o em metástase, quando a cura se torna improvável.
A verdade é que o cuidado com a saúde não é uma questão de gênero, mas de responsabilidade com a própria vida e com aqueles que nos amam. A prevenção, que envolve exames periódicos (a partir dos 50 anos, ou 45 em caso de histórico familiar), é apenas o primeiro passo para uma saúde integral. As ações da Secretaria de Saúde de Valinhos, ao incluir atendimentos odontológicos sem agendamento e campanhas de vacinação, mostram que o Novembro Azul é uma porta de entrada para uma reflexão mais ampla.
É hora de desconstruir o mito de que o homem é forte apenas se for descuidado. Força verdadeira reside na coragem de enfrentar um tabu, na consciência de que a vida é o bem mais valioso, e na humildade de buscar ajuda médica. É preciso abandonar as receitas caseiras ineficazes, os preconceitos ultrapassados e assumir o controle da própria saúde.
A prevenção salva, e Valinhos está oferecendo um leque de oportunidades para que essa salvação aconteça. O diagnóstico precoce é o passaporte para o futuro. Deixar o medo e o preconceito vencerem é uma sentença que, em 90% dos casos, poderia ter sido evitada.
Que a lição deste Novembro Azul em Valinhos seja a de que a verdadeira virilidade reside na atitude proativa, na quebra do silêncio e na busca pela vida plena e saudável. O exame de toque dura segundos, mas a vida que ele pode salvar é eterna.


