Economia

Morar nos EUA exige mais do que um sonho

NYC_Foto de Frank Winkler 

Para quem tem vontade de morar nos Estados Unidos, mudança exige planejamento e cuidados com detalhes burocráticos

O desejo de morar nos Estados Unidos continua presente na vida de muitos brasileiros que buscam novas oportunidades acadêmicas, profissionais e pessoais. Essa vontade costuma surgir a partir de referências de amigos, familiares, filmes ou das redes sociais, mas transformar o sonho em realidade exige preparo, clareza e disciplina. De acordo com estimativas do Ministério das Relações Exteriores (Itamaraty), cerca de 1,9 milhão de brasileiros vivem nos Estados Unidos, formando a maior comunidade brasileira no exterior — mais de 40% de todos os brasileiros que residem fora do país.

“Todo mundo paga um ‘pedágio’ para morar fora do Brasil. Ele pode ser financeiro, emocional ou comportamental e, na maioria das vezes, envolve os três”, afirma Carlos Eduardo Guimarães, brasileiro que vive há sete anos nos EUA. Ele é reitor da AGTU, instituição criada para democratizar o acesso ao ensino internacional e que oferece programas de mestrado em português, espanhol e inglês. Guimarães destaca que o erro mais comum entre quem decide dar esse passo é não conhecer a própria realidade financeira. “Entender seu orçamento, balanço pessoal e comportamento em relação ao dinheiro é fundamental. Contudo, o grande desafio não está no dinheiro em si, e sim nas escolhas e no hábito de planejar”, ressalta.

É justamente nesse ponto que muitos se surpreendem: R$ 10 mil no Brasil podem representar um padrão de vida confortável em diversas cidades, mas, nos Estados Unidos, esse valor convertido muitas vezes não cobre sequer o aluguel e as despesas básicas em boa parte dos estados. “Ou seja, não é apenas sobre ter recursos, e sim sobre compreender o custo estrutural e estar financeiramente preparado antes da mudança”, pondera Guimarães. Segundo ele, muitos brasileiros subestimam aspectos essenciais do processo e acabam enfrentando dificuldades que poderiam ser evitadas.

“Disciplina e pesquisa profunda antes de mudar de país são indispensáveis, e grande parte das pessoas não se dá conta disso. Muitos ignoram o real custo de vida, os impostos estaduais, o preço da saúde e até fatores regionais que afetam o orçamento, como clima, deslocamento e a dinâmica de cada cidade”, explica.

Para além das finanças, a preparação exige também uma linha do tempo realista, que respeite todas as etapas do processo. Não é possível resolver tudo em poucos meses: cada categoria de visto possui exigências e prazos específicos, o que impacta diretamente o planejamento financeiro, emocional e logístico. Quanto mais estruturado for esse processo, menor o risco de frustrações ao chegar aos Estados Unidos.

“É essencial saber se a pessoa realmente controla suas finanças ou se é controlada por elas. Isso significa mapear receitas, considerar a possibilidade de múltiplas fontes e detalhar todas as despesas — moradia, transporte, alimentação, lazer, educação. Só assim é possível calcular o índice de poupança e compreender o patrimônio líquido, evitando que o ‘sonho americano’ se transforme em frustração”, reforça o reitor.

“Estamos estruturando na AGTU um curso específico para brasileiros que desejam morar nos Estados Unidos, justamente para orientar esse planejamento financeiro e comportamental que faz tanta diferença na adaptação”, acrescenta. Mesmo quem acredita ter pesquisado tudo costuma se surpreender com os primeiros custos. Entre os pontos mais sensíveis está o sistema de crédito americano, que funciona de forma muito diferente do brasileiro. Sem o Social Security Number (SSN), equivalente ao CPF, o recém-chegado não consegue construir histórico de crédito e, por isso, praticamente tudo precisa ser pago à vista: aluguel, móveis, carro, eletrônicos e até serviços básicos.

A mudança também exige preparo emocional e comportamental. Guimarães conta que viveu isso ao se mudar com os filhos pequenos para os Estados Unidos. Enquanto as crianças se adaptaram rapidamente ao ambiente escolar, os adultos enfrentaram desafios maiores. “Uma experiência internacional verdadeira só acontece quando há disposição para mergulhar na cultura local, evitando o isolamento em grupos exclusivamente brasileiros. É preciso se abrir para a nova rotina, mesmo quando tudo parece estranho”, afirma.

Ao final, o reitor reforça que toda jornada internacional começa com um sonho, mas é o preparo que determina se ele se sustenta nos primeiros anos fora do país. Para quem está iniciando a organização da mudança, ele recomenda ter controle absoluto do orçamento, reunir um capital inicial consistente para o primeiro ano — idealmente 30% maior do que o previsto, lembrando do “pedágio” inevitável — e adotar uma mentalidade de longo prazo, entendendo que a adaptação cultural, emocional e financeira é um processo gradual. Para Guimarães, essa combinação é o que transforma o desejo de morar nos Estados Unidos em uma experiência realmente bem-sucedida.

Confira abaixo algumas dicas do especialista:

  1. Planeje como se fosse de verdade.

 Sim, parece óbvio, mas muita gente começa o processo achando que mudar para os EUA é só “organizar documentos e arrumar as malas”. Não é. Exige cronograma, etapas bem definidas, pesquisa profunda sobre vistos e uma boa dose de realismo financeiro.

2. Conheça o custo de vida antes do susto.

 Aluguel, saúde, impostos estaduais, transporte, clima e alimentação variam muito de estado para estado. É básico pesquisar, mas você se surpreenderia com a quantidade de pessoas que só descobrem isso morando lá. Planeje 30% a mais do que acredita que vai gastar.

3. Faça as contas que você já sabe que precisa fazer.

Montar reserva financeira (de três a seis meses do custo de vida projetado), entender a cotação do dólar, projetar os primeiros seis meses e calcular custos extras não é um conselho novo. Mas é justamente a “dica óbvia” que, se ignorada, vira o maior motivo de frustração ou retorno precoce ao Brasil.

COMPARTILHE NAS REDES