Saúde

Liberação miofascial ajuda a controlar dor lombar crônica, aponta estudo

Técnica que aplica pressão em tecido que envolve músculos e órgãos mostrou impacto positivo em pessoas com dor crônica, facilitando movimentos do dia a dia

Por Thais Szegö, da Agência Einstein

A dor lombar é um dos problemas de saúde mais comuns do mundo. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), cerca de 619 milhões de pessoas sofrem com ela atualmente, e esse número pode chegar a 843 milhões até 2050. A condição, muitas vezes crônica, compromete a qualidade de vida e limita atividades simples do dia a dia — o que explica a busca constante da ciência por formas de aliviá-la.

Uma dessas alternativas é a liberação miofascial, técnica terapêutica que consiste em aplicar pressão controlada sobre a fáscia, um tecido elástico que recobre e conecta músculos, ossos e órgãos. Quando a fáscia está rígida — algo que pode acontecer por má postura, sedentarismo ou esforço repetitivo —, ela prejudica a mobilidade e contribui para a dor. Ao estimular esse tecido, a liberação ajuda a reduzir tensões, aumentar a flexibilidade e facilitar o movimento.

Um estudo da Escola de Educação Física e Esporte da Universidade de São Paulo (EEFE-USP) corrobora a eficácia dessa abordagem no tratamento da dor lombar crônica. A pesquisa — que embasou a dissertação de mestrado do profissional de educação física Dárcio Esteves Ruiz Filho — mostra que uma única sessão com o rolo de liberação miofascial foi capaz de diminuir o esforço muscular necessário em tarefas cotidianas e melhorar a mobilidade e a velocidade de rotação do tronco.

“Comecei a aplicar a técnica com o rolo em alunos que relatavam desconforto lombar e sempre observei uma resposta positiva, tanto na dor quanto na sensação de relaxamento”, conta Ruiz Filho. O resultado o levou a aprofundar o tema em sua pesquisa, analisando alterações biomecânicas em pessoas com dor lombar crônica, ou seja, aquela que persiste por mais de três meses e já compromete a capacidade física.

O estudo

Os experimentos foram conduzidos no Laboratório de Biomecânica da USP, com a participação de 20 voluntários. Eles realizaram uma série de testes focados em força e resistência muscular, além de tarefas funcionais que simulam atividades do dia a dia — como se sentar e levantar de uma cadeira ou pegar um objeto no chão. Em todas as etapas, os pesquisadores monitoraram a atividade dos músculos abdominais e lombares dos participantes.

Na fase seguinte, os voluntários participaram de uma sessão experimental de liberação miofascial, deitando-se de barriga para cima sobre um rolo de massagem e realizando, por cerca de dois minutos, movimentos de vai e vem para massagear a região lombar e torácica da coluna.

Alguns dias depois, foi aplicada uma intervenção placebo: dessa vez, eles se deitaram de barriga para baixo enquanto o avaliador deslizava o rolo sobre as costas sem exercer pressão, simulando uma espécie de “liberação miofascial falsa” que serviu de comparação com a técnica real.

Após cada sessão, os voluntários realizaram tarefas projetadas para avaliar a ativação dos músculos abdominais e lombares e a percepção da dor. Entre elas estavam o teste de resistência muscular, o exercício stiff, a ação de pegar um objeto no chão (com e sem flexão dos joelhos), a flexão de braços e o relaxamento do tronco, o movimento de sentar e levantar e a rotação do tronco na posição sentada.

Em ambos os dias de experimento — antes e depois da aplicação do rolo e do placebo —, os participantes também passaram por uma nova coleta de dados e responderam a um questionário de dor, no qual atribuíram nota de 0 a 10 para a intensidade do incômodo. O objetivo era mensurar o impacto da técnica sobre a percepção dolorosa.

Embora não tenha produzido um efeito imediato na dor, a liberação miofascial demonstrou agir sobre um importante músculo estabilizador da coluna, o multífido lombar, reduzindo sua ativação durante o ato de se sentar ou levantar. Esse resultado sugere que houve menor esforço do sistema neuromuscular da coluna para executar esse movimento, repetido inúmeras vezes no cotidiano, o que pode contribuir para a melhora do quadro doloroso.

A técnica também promoveu um aumento na velocidade de rotação do tronco, indicando redução da rigidez e melhora na coordenação muscular. “Isso acontece porque a pressão mecânica do rolo estimula receptores presentes na fáscia e nos músculos, o que diminui a tensão muscular, aumenta a flexibilidade sem reduzir a força e ajuda a combater a dor muscular tardia decorrente de exercícios intensos, auxiliando na recuperação entre os treinos”, explica Ruiz Filho.

Liberação miofascial na prática

O método já é usado por diferentes especialistas. “De fato, a liberação miofascial é muito benéfica, pois nossos músculos podem ficar mais rígidos por fatores como treinos intensos, posturas mantidas por tempo prolongado ou estresse, formando alguns pontos de dor”, afirma o fisioterapeuta José Edson França, do Espaço Einstein de Esporte e Reabilitação, do Einstein Hospital Israelita.

A liberação miofascial pode ser realizada manualmente ou com uso de acessórios, como rolos, bastões e até bolinhas de tênis. Esses instrumentos também permitem a autoaplicação da técnica, desde que seja feita com a orientação de um profissional capacitado.

O método tem diversas aplicações além do alívio de tensões e dores musculares: também pode ser utilizado na recuperação de lesões ortopédicas, como tendinopatias e fasciopatia plantar, e no pós-operatório de cirurgias ortopédicas, auxiliando no processo de reabilitação. “Ao pressionar essas regiões, não estamos soltando a fáscia, o que exigiria uma força enorme, mas, sim, estimulando o sistema nervoso a reduzir a tensão no local”, explica França.

Também é bastante empregada no chamado recovery terapêutico — sessões realizadas após a prática de exercícios físicos para acelerar a recuperação muscular, reduzir a dor de início tardio, diminuir a percepção de fadiga e melhorar a sensação de bem-estar, especialmente em atletas.

Os movimentos de liberação miofascial podem ser incômodos, mas devem ser toleráveis. “Muitos acreditam que precisa envolver muita pressão, levando o paciente a sentir dor e ficar com hematomas após o tratamento. Mas aplicar pressão demais pode ter mais efeitos deletérios do que positivos, o que faz com que seja essencial a aplicação por um profissional capacitado, garantindo a execução adequada e segura”, recomenda o fisioterapeuta.

Fonte: Agência Einstein

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