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Na Entrevista da Semana o psicólogo Gabriel de Sousa Vieira fala sobre a profissão

RAIO-X
Nome completo: Gabriel de Sousa Vieira
Idade: 32 anos
Formação: Psicólogo
Principais atividades: Psicologia social comunitária

“Todo trauma pode ser superado, se tiver o cuidado necessário”

No dia 27 de agosto de 1962, passou a vigorar a Lei 4.119, com o reconhecimento oficial da Psicologia como profissão. Anos mais tarde, a data foi então instituída como Dia Nacional do Psicólogo. Na Casa da Criança de Valinhos, três profissionais da área atuam diariamente para garantir apoio aos acolhidos e às suas famílias.

Desde março deste ano, Gabriel de Sousa Vieira deixou de ser educador da instituição para atuar diretamente como psicólogo, nas frentes do acolhimento para as crianças e adolescentes.

Quando decidiu seguir esta profissão qual era seu principal objetivo? Ele foi alcançado?
Decidi cursar psicologia em 2012, inicialmente tinha interesse em psicologia clínica, mas ao longo do curso conheci a área social. Desde então, vi a oportunidade de usar minha profissão para auxiliar aqueles que mais precisam. E sim, alcancei meu objetivo, me sinto realizado neste sentido.

Qual a importância do papel do psicólogo nos serviços de acolhimento?

O psicólogo compõe a equipe técnica, juntamente com a assistente social e a pedagoga. Nesta equipe, o psicólogo é o profissional que lida com as emoções que permeiam o ambiente do acolhimento, além de atuar no processo de desenvolvimento das crianças. O psicólogo, muitas vezes, acaba sendo uma figura de referência e, até mesmo, paterna para muitas destas crianças.

Qual foi a experiência mais marcante que você teve? Consegue citar algum caso que tenha te tocado profundamente?
Todo caso é marcante, trabalhamos com um público delicado, onde todas as histórias são complexas e únicas. Não conseguiria citar um caso em específico, mas os primeiros casos com que tive contato me marcaram bastante. Nós só temos noção das violações praticadas contra as crianças quando vemos de perto, e isso sem dúvida nos sensibiliza.

Na maioria das vezes, as crianças atendidas nos serviços de acolhimento passaram por experiências traumáticas com suas famílias. Como é realizado na prática o trabalho com elas? O acompanhamento é feito diariamente?
Sim, o acompanhamento é diário, desde a chegada da criança no acolhimento. Inicialmente, é importante acolher seu sofrimento e ajudar a compreender os sentimentos que traz consigo. Depois, levantamos seu histórico de vida e desenvolvemos as estratégias de cuidado, sempre visando o desenvolvimento integral dos acolhidos. O objetivo deste processo é cuidar das violações sofridas e oferecer uma nova perspectiva de vida para estas crianças.

Além do atendimento prestado aos acolhidos, os psicólogos da Casa também trabalham com as famílias? Fale sobre esse processo.
É consenso para todos que não há lugar melhor para uma criança do que junto a sua família. Então, nosso trabalho maior é buscar reestruturar sua família de origem, para que ela possa se reorganizar e receber a criança de volta. É um trabalho de orientação e de suporte.  Apenas nos casos onde esta reintegração não é possível que consideramos a possibilidade de uma família substituta. É um trabalho conjunto, entre a Casa da Criança e a rede socioassistencial do município.

Existem técnicas específicas para pacientes de diferentes faixas etárias?

Cada faixa etária tem suas peculiaridades. Uma criança pequena, por exemplo, se manifesta muito mais através das brincadeiras do que da fala. Conforme vai se desenvolvendo, vai criando mais recursos para se expressar. Muitas vezes um desenho, uma carta ou um gesto valem mais do que um atendimento propriamente dito.

Quando ouvimos e lidamos diariamente com relatos traumáticos, é comum levarmos estas histórias para casa, o que acaba gerando nos profissionais uma certa carga emocional. Como você lida com essa questão? Às vezes o psicólogo também precisa de um psicólogo?
Às vezes não, sempre! Desde a graduação aprendemos que psicólogo precisa de acompanhamento psicológico para suportar esta carga emocional. Só consegue cuidar do próximo quem está cuidado também.

O que a Casa da Criança representa para você?
A Casa da Criança representa cuidado. O programa de acolhimento institucional se chama "Aconchego" e é isso que ela representa, um espaço acolhedor para as crianças, com uma equipe séria e dedicada.

"Existem traumas que não podem ser superados". Qual a sua opinião sobre essa afirmação?
Todo trauma pode ser superado, se tiver o cuidado necessário. No entanto, tudo é um processo, e todo processo tem o seu tempo. O psicólogo não traz a solução para nenhum trauma, ele ajuda o indivíduo a encontrar os recursos certos para passar pelas adversidades e a compreender o tempo de cada etapa deste processo.

Qual a maior recompensa do seu trabalho?
Não há nada mais gratificante do que encontrar com um ex-acolhido, já na vida adulta, que tenha conseguido superar as adversidades e esteja levando sua vida de forma digna. Sempre que isso acontece temos a sensação de dever cumprido.

 

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