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Professores se reinventam para minimizar prejuízos do ano letivo

A quarentena imposta pelo Estado de São Paulo em decorrência da pandemia de coronavírus tem gerado transformações em diferentes setores da sociedade. Nas escolas, desde o dia 23 de março, as aulas foram suspensas, fazendo com que alunos, pais, coordenadores e professores se reinventem para encontrar formas de minimizar os prejuízos causados ao ano letivo.
Sem saber ao certo até quando o cenário permanecerá o mesmo, governos e instituições privadas de ensino ainda tentam se adaptar e buscam novas estratégias e ferramentas para disponibilizar conteúdo pedagógico para alunos de diferentes idades.
Na esfera estadual, o governador João Dória (PSDB) lançou no início de abril o Centro de Mídias da Educação de SP (centrodemidiasp.educacao.sp.gov.br), uma plataforma que permite que os estudantes da rede estadual tenham acesso gratuitamente a aulas ao vivo, videoaulas e outros conteúdos pedagógicos durante o período do isolamento social.
Mas, o desafio é ainda maior para quem está na ponta. O professor da Escola Estadual Cyro de Barros Rezende, Rogério de Freitas Soares, ressalta que além do conteúdo disponibilizado pelo Estado, os educadores têm desenvolvido formas de manter a conexão com os alunos e propor atividades. “É um momento desafiador e de muita aprendizagem para todos. Nós, professores, tivemos que aprender a lidar com plataformas digitais e aqueles que têm mais facilidade, ajudam os que não tem. É tempo de colaboração, um ajudando o outro”, afirma.
Professor Rogério de Freitas Soares da Escola Estadual Cyro de Barros Rezende
Para Rogério, que dá aulas de geografia para o Ensino Médio, o maior desafio tem sido alcançar os alunos. “Nem todos têm acesso à internet. Alguns têm, mas não têm interesse. Eles não querem ir atrás e as famílias às vezes não ajudam também, acham que tudo é obrigação da escola. Então é muito difícil ter um feedback. A verdade é que a realidade dos alunos das escolas estaduais é muito heterogênea. O momento atual tem mostrado um abismo que existe entre alunos, um abismo que é minimizado nas aulas presenciais, mas à distância tem se intensificado. Alguns correm atrás, pesquisam, se interessam. Outros simplesmente não tocam no caderno”.
Rogério conta que, devido a utilização das plataformas digitais, o tempo de preparação para uma atividade aumentou consideravelmente. “Temos que aprender a lidar com essas ferramentas primeiro e, com isso, uma atividade que antes preparávamos em 1h, 1h30, agora chegamos a levar 3h”.
Na esfera municipal, os desafios são os mesmos. Desde o início de maio, a Prefeitura de Valinhos tem disponibilizado conteúdo pedagógico para os alunos da Rede Municipal de Ensino através do EducaDigital. Porém, as atividades não substituirão as aulas, que deverão ser respostas após o período de isolamento social. “No caso da Educação Infantil, essas atividades têm o objetivo de manter um vínculo com as famílias, com as crianças; através de propostas de atividades voltadas aos conteúdos já previstos nos Planos de Curso, de Ensino; de forma bem lúdica. Isso não substituirá as aulas porque não é possível se exigir a devolução das crianças. Muitas famílias não possuem recursos tecnológicos para imprimir, por exemplo”, afirma a professora da EMEB Dom Agnelo Ross, Camila Meirelles.
Como a ordem é se reinventar, Camila decidiu ir além e criou – por conta própria e com autorização da escola – ferramentas para manter o contato direto com os alunos e pais durante a quarenta. “Há alguns anos eu tenho uma prática de criar um grupo secreto no Facebook, com as famílias, onde eu socializo vivências da minha rotina, compartilho ideias, escrevo mensagens…Porém, com o início do distanciamento social, eu passei a utilizar esse espaço – e também criei um grupo de whatsapp – para disponibilizar atividades, histórias, filmes, a fim de manter o vínculo com as crianças e dar suporte aos pais. Isso já desde o primeiro dia de afastamento das aulas”.
Camila conta que tem se esforçado para propor atividades com materiais reciclados (inclusive eu faço em casa e explico, com vídeos e fotos). “Em uma determinada semana, o EducaDigital sugeriu que se fizesse uma atividade com Tangran. Muitas famílias disseram que não tinham como imprimir. Então, eu fiz um vídeo onde explicava como fazer o Tangran através de dobras no papel e recorte. Assim, todos conseguiram realizar a atividade, inclusive com papelão, que poderia ser pintado posteriormente, enriquecendo ainda mais a atividade e tornando um jogo para ser utilizado outras vezes”.
Sobre os prejuízos causado ao ano letivo, Camila ressalta: “A vivência na Educação Infantil vai muito além de conteúdos… nós também construímos vínculos, memórias afetivas, vivências que os fazem crescer enquanto cidadãos críticos e autônomos. Vai ser muito difícil recuperar isso. No retorno nada poderá ser igual, e o novo vai ser muito desafiador. Teremos que estar mais fortes, preparados em todos os sentidos. Vamos receber crianças emocionalmente abaladas, necessitando muito da gente, não só para ensiná-las conteúdos”, finaliza.
Escolas particulares
Enquanto escolas estaduais e municipais contam com materiais de apoio disponibilizados pelos governos, as escolas particulares se reinventam para criar suas próprias metodologias de ensino dentro da nova realidade.
Porém, os desafios para os educadores é o mesmo em todas as esferas. A valinhense Maria Fernanda Prestes Tardelli é professora de ensino infantil de uma escola particular em Campinas. Lá, as aulas são ministradas ao vivo diariamente pelo aplicativo Zoom. “Reunimos os alunos como se estivéssemos em sala de aula e damos as aulas e acompanhamos a realização das atividades. Ao final da aula passamos mais atividades – correspondentes às lições de casa – recebemos, corrigimos e enviamos de volta para os alunos”, descreve.
Se trabalhar de casa parecia um sonho, a nova realidade tornou o trabalho muito mais exaustivo. “Acordo preparando e corrigindo atividades, entro nas aulas online logo após o almoço e vamos até às 17h10, que seria exatamente o horário da escola. Em seguida, volto para as plataformas para passar mais atividades. Não podemos deixar as correções acumularem, porque se torna impossível acompanhar tudo”, afirma a educadora.
Assim como os outros professores, Maria Fernanda foi obrigada a se adaptar a nova realidade sem aviso prévio. “Foi de um dia para o outro, não tivemos tempo de estudar as plataformas, de aprender a preparar conteúdo específico para aulas online, tivemos que aprender tudo na marra. É um momento muito desafiador, de aprendizado diário, mas graças a Deus, tem dado certo”.
Sobre os desafios, a professora ressalta que manter a concentração das crianças nas aulas online têm sido uma tarefa que exige persistência. “Por incrível que pareça, os adultos também atrapalham muito. Peço sempre para que as crianças estejam em um ambiente silencioso, confortáveis, que se preparem com dez minutos de antecedência, mas nem sempre isso acontece. Muitas vezes vejo alunos sentados na cama, com cadernos no colo e um pacote de bolacha do lado. Isso acaba distraindo a classe toda. Mas, entendemos que para os pais também têm sido difícil, afinal, muitos estão trabalhando dentro de casa e já enfrentam uma rotina complicada. Por isso, estamos dando mais ênfase para as aulas ao vivo. Nosso objetivo é dar cada vez mais suporte para que possamos, todos juntos, atravessar esse período”, finaliza Maria Fernanda.
E essa é a nova realidade da educação: enquanto os professores se viram em 30 para conseguir dar conta do recado, pais e alunos se adaptam do outro lado da tela em uma nova realidade que ainda não têm data para acabar.
Principais ferramentas utilizadas pelos professores, além das disponibilizadas por governos e escolas
Zoom Cloud Meetings – aplicativo gratuito de videoconferência online com até 25 pessoa
Padlet – ferramenta online que permite a criação de um mural ou quadro virtual dinâmico e interativo para registrar, guardar e partilhar conteúdos
Google Classroom – sistema de gerenciamento de conteúdo para escolas que procuram simplificar a criação, a distribuição e a avaliação de trabalhos.
Grupo de Whatsapp – para manter contato com pais e alunos


