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Casal de mulheres luta na Justiça para registrar o filho

Um casal de mulheres de Valinhos luta na justiça para ter o direito de registrar o filho, concebido em uma inseminação caseira, com dupla maternidade. O primeiro pedido foi negado pela Justiça. Elas recorreram da decisão e aguardam o veredito. Em caso de nova negativa, pretendem recorrer a instâncias superiores para terem o direito da criança garantido.

Roberta Dias e Jéssica Alvarenga se conheceram em um período difícil para ambas. O relacionamento começou por conversas via internet e avançou por um único motivo: elas tinham sonhos em comum. O principal deles? Ter um filho. A afinidade e carinho cresceu de tal forma que o casamento aconteceu naturalmente. E com o novo passo, veio então o desejo de transformar em realidade o anseio que preenchia diariamente o coração do casal: gerar uma criança.

Planos, planilhas, mudanças, planejamento. Tudo, de acordo com Roberta, começou a girar em torno desta nova meta. O que elas não sabiam, contudo, é que após conseguirem realizar o sonho que as uniu, elas teriam que ir à Justiça para garantir que o filho tenha o nome das duas na certidão de nascimento. 

Segundo Roberta, a criança só poderia ser registrada com dupla maternidade se a inseminação tivesse sido realizada em uma clínica, o que não aconteceu devido à falta de recursos. “Os valores para inseminação em clínicas são muito altos. Cada tentativa custaria cerca de R$ 15, R$ 20 mil. Chegamos a pensar em vender um carro para fazer o procedimento, mas não era garantido que conseguiríamos engravidar. Obviamente, se fosse, teríamos vendido qualquer coisa”.

Para a inseminação caseira, algumas possibilidades foram cogitadas. “Tentamos mais diversas vezes realizar o procedimento com um homem famoso no meio de doadores de esperma para inseminação caseira. Porém, não obtivemos sucesso. Foi quando um amigo da Jéssica – que já havia se oferecido anteriormente – veio até nós dizendo que queria mesmo ser nosso doador. E foi incrível porque engravidamos na primeira tentativa. Ou seja, era pra ser”, conta.

O bebe nasceu no dia 1º de abril de 2020. E, até o momento, somente o nome de Roberta consta na certidão. “Queremos que a Justiça nos conceda um direito que já é nosso. Sem o nome da Jéssica na certidão, ele não pode ser dependente dela no convênio médico da empresa, ela não pôde tirar licença maternidade…ou seja, são nossos direitos e ver isso ser negado é muito triste”, diz Roberta.

Dispostas a lutar o quanto for preciso para conseguir o registro, Roberta relembra que foi a companheira quem esteve com ela em todos os momentos da gravidez. “Esse filho é nosso. A Jéssica sabe que é mãe dele. Foi ela que esteve comigo o tempo todo, aturando e me dando apoio em todos os momentos, até nos de chatice, mal humor, dor. Foi uma gravidez difícil e ela sempre esteve lá. Agora querem nos negar esse direito? Quer dizer que se qualquer zé da esquina fosse até o cartório registrar uma criança ele poderia, e minha esposa não? É no mínimo muito injusto. Essa luta não é só nossa”.

Roberta reclama ainda sobre a influência do poder econômico, que para ela interfere na aplicação da lei. "As pessoas que têm dinheiro para fazer a inseminação em clínicas saem de lá com direito de registrar a criança com dois pais ou duas. Espero que no futuro as leis sejam mais justas e o que vale para um valha para todos, independentemente de dinheiro".

Em nota, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) informou que não pode se manifestar sobre matéria judicializada. “Os magistrados têm independência funcional para decidir de acordo com os documentos juntados ao processo e seu livre convencimento”, diz o tribunal.

Vara de Família de São Carlos acatou pedido semelhante

No último dia 23, o TJ informou que a 2ª Vara da Família e das Sucessões da Comarca de São Carlos acolheu pedido de dupla maternidade a um casal homoafetivo em condições bem semelhantes às do casal de Valinhos. As autoras, casadas legalmente, realizaram inseminação caseira com material genético doado por pessoa anônima. O juízo determinou que conste na certidão os nomes das duas como mães e que o documento seja adequado para que constem os nomes dos avós sem distinção de ascendência materna ou paterna.

O juiz Caio Cesar Melluso destacou em sua decisão a necessidade de atender aos interesses do filho do casal, de resguardar seus direitos constitucionais e também os previstos no Estatuto da Criança e do Adolescente. (FLN/AAN)

 

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