Alternativa
Carlos Gomes: o campineiro que colocou a música brasileira no palco internacional

Apresentação do Conservatório Carlos Gomes – Crédito Firmino Piton
Representantes da cena cultural explicam como maestro trouxe relevância para o ensino da música em Campinas
O nome de Antônio Carlos Gomes atravessa séculos como um símbolo de Campinas e do Brasil no cenário cultural. Nascido em 1836, o maestro e compositor foi o primeiro das Américas a conquistar espaço no disputado palco da ópera europeia, levando para fora do país a força da música brasileira em uma época em que a Itália era considerada o coração da ópera mundial.
Ao longo do mês de setembro, a Secretaria Municipal de Cultura e Turismo, em parceria com diversas entidades, promove o “Mês Carlos Gomes”, que reúne várias atividades sobre o legado do maestro. Para conferir a programação, acesse o link: https://campinas.sp.gov.br/noticias/mes-carlos-gomes-2025-tem-programacao-especial-em-campinas-confira-as-atividades-128547
O Guarani
Sua obra mais conhecida, O Guarani (1870), estreou em Milão e rapidamente ganhou notoriedade. Ao inserir elementos nacionais em uma tradição essencialmente europeia, Carlos Gomes não apenas conquistou aplausos, mas também abriu caminho para que artistas brasileiros fossem reconhecidos no exterior.
Carlos Gomes foi também o primeiro compositor não europeu a ser aplaudido no prestigiado Teatro Alla Scala, feito comparável a um artista latino-americano ser celebrado hoje em palcos como a Broadway ou Hollywood.
O Brasil e o incentivo à música
A trajetória de Carlos Gomes está profundamente ligada ao contexto do Brasil imperial. Em uma nação ainda jovem, que buscava sua identidade cultural após a Independência, o compositor encontrou incentivo em Dom Pedro II, conhecido por seu apoio às artes e ciências. Foi o imperador quem viabilizou sua formação na Europa, reconhecendo nele um talento capaz de representar o país no exterior.
A herança musical e a atualidade
A influência de Carlos Gomes não se restringe ao século XIX. Campinas mantém viva a memória do compositor por meio de instituições que levam seu nome, como o Conservatório Carlos Gomes, e de homenagens em concertos regulares da Orquestra Sinfônica Municipal de Campinas. Esses espaços ajudam a reforçar sua presença na vida cultural da cidade e mantêm sua história acessível às novas gerações.
Para o diretor da Orquestra Sinfônica Municipal de Campinas, Wanilton Mahfuz, a obra de Carlos Gomes permanece atual e inspiradora. “A música de Carlos Gomes se renova a cada dia. Sua genialidade foi autenticada em sua estadia na Itália, onde conviveu com os grandes mestres da ópera e compôs peças de excelência e intensidade semelhantes, conciliando temas brasileiros, como na ópera O Guarani, e temas universais, presentes nas óperas Fosca e Salvator Rosa”, analisou.
“Em sua terra natal, Campinas, procuramos valorizar ao máximo sua obra e sua memória, incluindo suas peças nos concertos da OSMC, além de incentivar essa prática aos artistas campineiros, e dessa forma mantendo vivo e ativo o seu legado”, afirma Mahfuz.
Outro símbolo da presença do maestro em Campinas é a Praça Carlos Gomes, localizada no Centro da cidade. A memória do compositor também é preservada no Museu Carlos Gomes, instalado no tradicional Centro de Ciências, Letras e Artes, e no Conservatório Carlos Gomes, que mantém vivo seu legado por meio da formação musical — veja aqui alguns locais de Campinas que homenageiam o maestro.
Essa missão de continuidade é ressaltada por Lara Zigiatti, que destaca o papel do Conservatório em manter viva não apenas a memória de Carlos Gomes, mas também a filosofia de sua mãe, Léa Zigiatti, na formação de crianças e jovens. “Ecos de Léa! Com essa expressão de Jesus Seda (bonequeiro, artista plástico e ex-aluno do Conservatório), proferida no tributo em homenagem a Léa Ziggiatti, tento descrever o legado de minha mãe — um legado que sigo como norte na formação das nossas crianças. Criança é sensação, é olhar vivo e atento a tudo que é belo. ‘Menos técnica e mais criatividade’ era uma de suas frases para esse momento de descoberta, quando a criança precisa interiorizar o que vê, ouve e sente, para só depois deixar que tudo isso venha à tona, no seu exterior. ‘Arte é uma coisa de dentro pra fora’ — e é exatamente isso que incentivamos”, explica a representante do Conservatório Carlos Gomes.
Ainda segundo Lara Zigiatti, na Iniciação Artística, a Bandinha Rítmica, existente no Conservatório desde o início da década de 1960 e ativa até hoje, mantém viva essa filosofia. “As crianças estão se sentindo orgulhosas em tocar a protofonia de O Guarani, cantar seus lindos temas e perceber cada ritmo de sua obra mais famosa. A eternidade se dá pela sucessão: se a cada ano incentivarmos nossas crianças a vivenciarem, através da música e das artes, a obra desse campineiro ilustre, sua memória jamais se apagará. Ele continuará sendo imortal”, orienta Lara.
Do erudito ao popular
O impacto do compositor campineiro vai além do repertório musical. Sua obra atravessou o tempo e os ambientes. O Guarani, por exemplo, foi eternizado como abertura do programa radiofônico “A Voz do Brasil”, aproximando um clássico da ópera italiana do cotidiano popular brasileiro. Isso demonstra como sua criação ultrapassou o ambiente erudito e se tornou parte da cultura nacional.
Um legado universal
O percurso de Carlos Gomes também representa um marco de perseverança: um artista latino-americano que, apesar das barreiras culturais e sociais, conquistou respeito em um espaço dominado por nomes europeus. Esse aspecto torna sua história ainda mais relevante em debates atuais sobre a valorização da produção cultural fora dos grandes centros.
Mais de 180 anos após seu nascimento, Carlos Gomes continua sendo lembrado como o campineiro que fez a música brasileira ecoar em teatros internacionais e que, até hoje, inspira músicos e pesquisadores. Campinas carrega não apenas sua memória, mas também a missão de manter vivas as notas que transformaram o compositor em um ícone universal.


