Alternativa
De Valinhos para a COP 30: O protagonismo da advocacia local na crise climática global

Neste domingo, dia 9, Valinhos ganha representatividade no maior fórum climático do mundo. A Dra. Elza Cláudia dos Santos Torres, presidente da Comissão Especial do Clima (COMCLIMA) da OAB Valinhos, embarca para Belém como embaixadora e representante da subseção na COP 30. Em entrevista à Folha de Valinhos, Dra. Elza destaca que sua participação tem um “simbolismo muito especial”, pois reafirma que o protagonismo climático “nasce nos municípios”. A missão da COMCLIMA é trazer de volta para a região ferramentas práticas de governança local, legislações e experiências que fortaleçam a economia verde e a capacidade da cidade de enfrentar eventos climáticos extremos. A advogada enfatiza que o Direito e a atuação local são essenciais para transformar compromissos globais, como o Acordo de Paris, em realidade para Valinhos. Leia a entrevista completa no Portal da Folha de Valinhos.
FOLHA DE VALINHOS A senhora embarca para a COP 30 como representante da COMCLIMA (Comissão Especial do Clima) da OAB Valinhos. Qual é a importância e o significado desta representação de uma Subseção do interior de São Paulo em um evento de dimensão global como a COP?
DRA. ELZA Em primeiro lugar, gostaria de agradecer por minha participação neste espaço e parabenizar o FV pela interessante pergunta e pelo destaque da observação, quanto à representação de uma subseção do interior de São Paulo em um evento de dimensão global como a COP.
Pois bem, essa representação carrega um simbolismo muito especial. Estar na COP 30 como presidente da Comissão Especial do Clima (COMCLIMA) da OAB Valinhos e como Embaixadora da ANAMMA e do movimento Mulheres pelo Clima e Biodiversidade significa levar para um fórum global a voz da advocacia de uma subseção do interior de São Paulo, comprometida com a transformação climática global, a partir do território local do município. Representar Valinhos e a OAB em um evento dessa magnitude é reafirmar que o protagonismo climático não é exclusivo das grandes capitais ou das instâncias federais — ele nasce nos municípios, na atuação cotidiana de pessoas e instituições que fazem a diferença.
FV Quais foram os principais temas e pilares da COP (mitigação, adaptação, financiamento, tecnologia, capacitação) que foram priorizados pela OAB Valinhos na preparação para o evento, e qual a principal contribuição que a senhora espera trazer de volta para a nossa região?
DRA. ELZA A OAB Valinhos, por meio da COMCLIMA, tem como pilares de atuação a mitigação, a adaptação, a capacitação técnica para trabalharmos com as SBNs (SOLUÇÕES BASEADAS NA NATUREZA), o engajamento da sociedade, e, de forma especial, da comunidade escolar. Trabalhamos para fomentar políticas públicas que reduzam emissões, mas, sobretudo, para fortalecer a capacidade dos municípios de se adaptarem aos impactos da crise climática.
Na volta da COP, espero trazer instrumentos práticos de cooperação e de governança climática local — modelos de legislação, incentivos à economia verde e experiências exitosas que possam inspirar ainda mais a advocacia valinhense e regional, os gestores, e os cidadãos da nossa região.
FV Como o Direito e a atuação da advocacia podem ser ferramentas eficazes para a implementação dos compromissos climáticos (como as NDCs do Acordo de Paris) no nível municipal e estadual, e como essa discussão se insere no contexto da COP?
DRA. ELZA Penso que o Direito é o alicerce da ação climática. Ele transforma compromissos internacionais em normas, planos e instrumentos executáveis. A Advocacia tem um papel essencial na tradução técnica dessas metas — como as NDCs (Contribuições Nacionalmente Determinadas)— para a realidade dos municípios, por meio de leis, contratos sustentáveis, licitações verdes e instrumentos de planejamento territorial urbano e rural. Na COP, levaremos a mensagem de que a Advocacia Climática no município de Valinhos é uma ponte entre a ciência, a política pública e a cidadania.
FV A COP 30 será sediada no Brasil, na Amazônia. Quais são as expectativas e os desafios únicos de ter uma Conferência focada em clima e desenvolvimento sustentável realizada no bioma amazônico, e como isso impacta os debates sobre os temas “povos indígenas” e “perdas e danos”?
DRA. ELZA A Amazônia, s.m.j., é o coração climático de nosso lindo Planeta Azul. Realizar ali a COP 30 é um convite à reflexão sobre os limites do nosso modelo de crescimento econômico. É também uma oportunidade de ouvir os povos indígenas e as comunidades tradicionais, guardiãs de um conhecimento ancestral indispensável à preservação dos ecossistemas.
O tema de “perdas e danos” é uma das pautas centrais da COP 30, pois tem o objetivo de passar da fase das promessas acordadas nas COPs anteriores (Paris, Baku, entre outras) para a implementação efetiva do Fundo de Perdas e Danos. O denominado “Roteiro de Baku a Belém”, propõe um montante de pelo menos US$ 1,3 trilhão anuais em financiamento climático global até 2035, com o objetivo de ampliar o acesso a recursos para os países em desenvolvimento e às áreas mais vulneráveis aos impactos da Crise Climática, incluindo para as perdas e danos.
Penso, ainda, que o tema de “perdas e danos” ganha um sentido ainda mais profundo quando discutido na Amazônia, porque nos lembra que os impactos climáticos não são apenas econômicos, mas, sobretudo, sociais, culturais e que tocam a dimensão da dignidade da pessoa humana.
FV O princípio da “responsabilidade comum, porém diferenciada” exige que países desenvolvidos liderem o financiamento climático. Quais são as expectativas em relação aos avanços nas negociações de financiamento e tecnologia na COP 30, especialmente em benefício dos países em desenvolvimento como o Brasil?
DRA. ELZA Esperamos que a COP 30 avance na definição de mecanismos mais transparentes e eficazes de financiamento climático, garantindo recursos para adaptação, mitigação e tecnologia nos países em desenvolvimento. O Brasil tem um papel estratégico como mediador entre o Norte e o Sul globais. Precisamos mostrar que investir em natureza é investir em economia, e que o financiamento climático não é caridade — é uma questão de justiça e sobrevivência coletiva.
FV O tema da “Transição Justa” tem ganhado destaque nas negociações. Como a senhora entende a aplicação desse conceito, que busca garantir que a mudança para uma economia de baixo carbono seja equitativa e inclusiva, no contexto brasileiro?
DRA. ELZA A Transição Justa significa garantir que a mudança para uma economia de baixo carbono não deixe ninguém para trás. No Brasil, isso envolve qualificação profissional, inovação tecnológica e inclusão social, mas também, respeito aos territórios e às vocações locais.
Defendemos que essa transição precisa ser territorializada, incorporando as realidades dos municípios, que podem servir de laboratórios vivos para políticas públicas climáticas integradas — como Valinhos — que possui Unidades de Conservação (Estação Ecológica, ARA – Área da Reforma Agrária e a APA da Serra dos Cocais), além de suaszonas ruraisde grande importância para o desenvolvimento econômico e socioambiental sustentável, cooperando efetivamente para a descarbonização regional, bem como para atrair segurança hídrica e alimentar.
FV Valinhos, inserida na RMC, sofre com eventos climáticos extremos. De que forma a senhora avalia a vulnerabilidade climática de Valinhos e como as discussões sobre Adaptação e resiliência na COP 30 podem oferecer modelos ou insights para a gestão pública municipal?
DRA. ELZAValinhos já sente os efeitos das mudanças climáticas, como: chuvas intensas, inundações, ondas de calor, estiagens muito secas que favorecem incêndios, em áreas de vital importância para a biodiversidade e regulação climática, a exemplo, da Serra dos Cocais e de áreas verdes e rurais nas regiões da Fonte Mécia, do Macuco, Capivari e Reforma Agrária. Isso exige um olhar sistêmico sobre adaptação e resiliência.
O Lançamento do Fórum Permanente sobre Mudanças Climáticas de Valinhos e Região, em 6 de outubro, último, nasceu justamente para responder a esse desafio, reunindo poder público, academia, setor privado, sociedade civil, e as comunidades escolares. Na COP 30, buscarei experiências internacionais de resiliência territorial nos municípios (englobando suas zonas urbanas e rurais), formação de corredores ecológicos, microflorestas e soluções baseadas na natureza, que podem inspirar e fortalecer a gestão pública local.

FV Existe algum modelo de legislação ambiental ou de clima, debatido ou apresentado na COP, que a senhora considera urgente e viável de ser adaptado e proposto para os municípios da nossa região (Valinhos/Campinas)?
DRA. ELZA Sim. É urgente que os municípios adotem leis municipais que abranjam ações climáticas, alinhadas ao Acordo de Paris, prevendo metas de redução de emissões e planos de adaptação. Para tanto, entendo que tais ações, deveriam estar contempladas e previstas nas leis orçamentárias, como o PPA (Plano Plurianual), a LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias) e a LOA (Lei Orçamentária Anual), tendo como fundamento a Lei do Plano Diretor, que, em meu modo de ver é a base, inclusive, para obtermos verbas e financiamentos (nacionais e/ou internacionais), inclusive dos fundos climáticos que serão trabalhados nesta COP.
Outro ponto é a integração entre planejamento climático e o planejamento territorial municipal (urbano/rural), incluindo incentivos fiscais verdes e diretrizes de revitalização verde — como o que estamos a implementar em Valinhos por meio do Projeto Primavera Municipal, com a multiplicação das microflorestas urbanas e dos corredores ecológicos.
FV O Painel Intergovernamental sobre Mudança do Clima, IPCC, ressalta a importância dos relatórios científicos para a tomada de decisão. Na sua opinião, como a OAB pode ajudar a mobilizar a sociedade civil, especialmente os jovens, para que a ciência do clima e os resultados da COP influenciem as políticas locais?
DRA. ELZA Eu sempre digo que a OAB é o grande ícone da sociedade civil, pois foi a responsável pela redemocratização do Brasil. Além disso, a OAB é uma instituição com credibilidade e capilaridade. Portanto, penso que podemos e devemos usar essa força para promover educação climática cidadã.
Por meio de outra importante Comissão da OAB Valinhos, que é a OAB Vai à Escola, são trabalhados com os estudantes, vários temas, entre eles: meio ambiente, sustentabilidade e mudanças climáticas, despertando-os desde cedo o senso de responsabilidade e pertencimento. Os jovens são agentes de transformação — e tenho minhas convicções que a Advocacia possa abrir caminhos para que a ciência se converta em ação.
FV O que, na visão da Dra. Elza, seria considerado um resultado de sucesso para o Brasil na COP 30?
DRA. ELZA Um resultado de sucesso será aquele que alinhe a Justiça Social com a denominada “Ambição Climática” (que significa alcançar a diminuição das emissões dos gases de Efeito Estufa e as remoções desses gases da atmosfera – responsáveis pelo Aquecimento Global – através, por exemplo, do papel desempenhado pelas áreas verdes – rurais e florestais – na captura de carbono. Queremos ver o Brasil reafirmando seu compromisso com o desmatamento zero, com a economia de baixo carbono e com o necessário fortalecimento da governança municipal, especialmente, por meio dos representantes da sociedade civil nos Conselhos Municipais. Mas, sobretudo, queremos que o país se veja como potência climática, reconhecendo que proteger nossos biomas é proteger a todos – nos dias presentes, e nos dias vindouros, com as futuras gerações.
FV Qual é a mensagem mais importante que a senhora trará da COP 30 para a comunidade de Valinhos e, em especial, para os advogados e estudantes de Direito da nossa subseção, sobre o papel de cada um na agenda climática?
DRA. ELZA Minha mensagem é de fé, esperança e corresponsabilidade. A Advocacia tem o poder de transformar princípios em políticas, leis em práticas e compromissos em resultados concretos. A Agenda Climática não é uma pauta distante — ela começa localmente, no município, no escritório, na escola, na praça, na igreja, na casa de cada cidadão. Voltarei da COP 30 com o propósito renovado de fortalecer essa consciência: agir localmente é influenciar globalmente. E é isso que move o trabalho da COMCLIMA e da OAB Valinhos.


